sábado, 3 de abril de 2010

LP Gil & Jorge (Ogum Xangô) - Gilberto Gil e Jorge Ben

Quando dois músicos de excepcional qualidade e no auge de suas criatividades artísticas se encontram em um estúdio e com toda a liberdade possível gravam um disco, só com seus violões e ajuda de um contrabaixista (Luís Wagner) e um percussionista, o ótimo Djalma Correa, só poderia ter um excelente produto final. Gilberto Gil e o ainda na época Jorge Ben (hoje, Jorge Ben Jor) assumem em "Gil & Jorge" a identificação musical existente entre ambos e que ganhou vida sob o título dos orixás Ogum e Xangô. Ninguém pode negar que colocar Gil e Jorge em um estúdio e deixá-los produzir livremente por tempo indeterminado deu um belo fruto. Ogum Xangô é mágico do início ao fim e cada canção literalmente estrangulada pela dupla tem sua particularidade que no conjunto da obra formam este disco belo, espontâneo e logicamente...sensacional.

Vejam o que Gilberto Gil falou na época do lançamento deste disco sobre Jorge Ben. “Eu vejo a música do Jorge como a que mantém elementos mais nítidos da complexidade negra na formação da música brasileira. Modos musicais diferentes vieram para o Brasil através de várias nações africanas. Jorge assume o que veio do norte da África, o muçulmano, como elemento básico do seu trabalho. Ele não gosta de perder a perspectiva primitivista, não deixa de se ligar no gege, ketu, iorubá. Mas ele tem um outro lado que inclui o moderno” .

O disco, apesar de um álbum duplo, tem poucas músicas, mas muito, muito improviso, gravado em apenas uma noite, que deve ter sido uma noite mágica, pelo resultado alcançado, provou o que já se sabia, que os dois são mestres na arte do improviso. O lado 1 do disco 1 tem apenas duas músicas, a suave “Meu Glorioso São Cristovão” de Jorge Ben, em um arranjo bem lento, como se eles estivessem no aquecimento para o que viria depois, só voz e violões, fechando o lado “Nega” de Gilberto Gil, aí já num ritmo um pouco mais acelerado, com a entrada da percussão, a base rítmica começa a possuir as características contagiantes e tradicionais da música popular brasileira, puro ritmo em mais de dez minutos de duração. O lado 2 do disco 1, também com duas músicas, começa com “Jurubeba” de Gil, diz à lenda que o disco todo foi gravado sob os efeitos do licor de jurubeba, dizem que esta era uma jurubeba “especial”, se há alguma verdade, o fato é que esta tal “jurubeba” dá uma ótima inspiração, diz a letra “Jurubeba, Jurubeba, planta nobre do sertão” o que serviu de inspiração para uma levada meio forró, meio baião, esta música é puro prazer, uma jam de mais de onze minutos pra lá de dançante. Fechando o primeiro disco, mais uma de Jorge “Quem mandou (pé na estrada)” numa levada mais de samba rock, bem ao estilo de Jorge, improvisos para balançar o esqueleto.

O disco 2 começa com a melhor música do disco e uma das mais férteis da fase inicial de Jorge Ben e consequentemente da MPB, a swingada “Taj Mahal” com seus mais de quatorze minutos de puro swing, improviso e balanço, é impressionante a força vibrante que esta música exerce, mesmo só com violões e percussão é impossível não se contagiar com seu balanço, é impossível passar incólume a um amor tão eterno. A segunda música deste lado Jorge é “Morre o burro fica o homem”, improviso, swing e balanço. O lado 2 é o lado Gil com as canções “Essa é pra tocar no rádio” e “Filhos de Gandhi” dois exemplos do estilo balançado e alegre de Gil, ritmo africano adaptado ao carnaval baiano, pré Axé Music (quando se tocava música de qualidade), numa levada mais compassada. Encerrando o disco uma parceria entre os dois, “Sarro”, quase uma vinheta, reflete bem o espírito do álbum, alegria pura, como se dizia antigamente para expressar algo muito bom, muito bem feito, um verdadeiro sarro.

Apesar da ótima qualidade sonora do disco, ele não teve uma receptividade muito boa de público na época, inclusive com algumas críticas negativas dos jornalistas especializados, tanto é que o disco passou pouco tempo nas lojas e nunca foi relançado em LP, só mais recentemente, portanto muitos anos depois de seu lançamento é que teve uma edição em CD, mesmo assim com cortes. Pela qualidade, merecia uma melhor atenção, obra prima da MPB, som apropriado para um sábado ou domingo à tarde, durante uma feijoada e tomando muita caipirinha.

Ano de lançamento: 1975
Ano de aquisição: 1976

6 comentários:

  1. Ogum

    Cantavam num tal tempo e canto, um conto,
    Que um moço tendo na aldeia chegado
    Tentou conversar em vão e ficou tonto
    Sem respostas de um povo silenciado.

    O tal moço sentiu-se furioso,
    Por fantasiar aquela zombaria
    Do povo, a quem se mostrou poderoso
    E matou todos com sua artilharia.

    Tempos depois, chegando noutra aldeia,
    Contou o ocorrido para um ancião.
    O velho falou ser coisa na veia
    Do povo, nuns dias, nada dizer não.

    O moço, Ogum, sentindo-se culpado
    jurou proteger todo o injustiçado.

    Fernanda Barros de Matos
    Sociedade do Baobá - (Soneto tipo inglês, 14 versos, três quartetos e um dístico, decassilábicos, ABABCDCDEFEFGG)

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  2. Salve, salve Fernanda.
    Obrigado pela visita.
    Robson

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  3. Robson, adoro esse disco e nas minhas pesquisas achei seu blog. Queria saber se vc pode me ajudar: estou querendo comprar o LP desse disco, mas vi duas capas. Além dessa que ilustra seu texto tem essa aqui tbm: http://produto.mercadolivre.com.br/MLB-463741551-jorge-ben-gilberto-gil-lp-vinilo-_JM
    Você sabe dizer qual a diferença? Essa outra capa é referente a essa versão que tem cortes nas músicas? Parabéns pelo blog. Abraços.

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    1. Débora Muniz,
      primeiramente obrigado pela visita e elogio, estive afastado do blog por pura falta de tempo, não sei se ainda servirá a resposta, mas o disco original é este cuja capa está postada aqui no blog, afinal foi comprado a época, é um LP duplo, este do link foi um relançamento em LP simples, vale procurar o original, todas as músicas são imperdíveis, mas é um disco bastante difícil de encontrar. Abraços.

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  4. Vendo aqui seu blog e prestigiando esse ótimo disco ...como vc disse acima, é um disco difícil de se encontrar ...no entanto enquanto comento o meu ta rodando na vitrola ,adquirir hj perdido num ferro velho aqui perto de casa ...muito novo e edição primeira sem cortes...disco mágico!

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  5. Muito boas informações! só nao concordo com taj mahal ser a melhor musica... acho a mais chata e massante do CD, que sem duvidas é impecavelmente maravilhoso. Ouvi dias desses que na verdade os dois tomaram LSD quando gravaram as musicas no estudio... acho que esse foi o tempero usado na bebida de jurubeba, hein! hahahaha abraço

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