segunda-feira, 29 de março de 2010

LP Desire - Bob Dylan

Mais uma obra prima do Bardo revolucionário, a fase setentista de Bob Dylan foi uma das mais profícuas e brilhantes de sua carreira, álbuns maravilhosos foram lançados onde ele explicitava toda a sua verve contestatória, apesar, ou por isso mesmo, de ter sido uma época difícil em seu relacionamento pessoal, época muito conturbada de sua vida pessoal, principalmente com o grande amor de sua vida sua ex-esposa Sara, a quem dedicou uma das mais belas canções deste LP, ele cantou o amor desesperado por Sara e as dores de uma separação amorosa, posto a toda prova e a todos.

Desire é um disco deslumbrante, o melhor de Dylan, segundo Alan Rinzler, autor do livro sobre seus discos. Musicalmente, é o mais perfeito, o mais brilhante, com a bela voz de Emmylou Harris colada à de Dylan, que está madura, forte, envolvente, emocionante. E há o violino estranho, meio cigano, de Scarlet Rivera sublinhando as melodias que fazem lembrar cantos judaicos. Inicia com a canção “Hurricane”, a mais violenta de todas as “canções de protesto” que Dylan compôs nos anos 60, sobre Rubin Carter, o Hurricane, um dos mais promissores pesos-médios do boxe americano da época, preso e condenado sob a acusação de um tríplice assassinato. Dylan garante que as testemunhas mentiram, dá o álibi que Hurricane apresentou e que “o júri branco” não considerou, denuncia o racismo do processo, investe contra a própria instituição do júri popular “como pode a vida de um homem desses estar na palma da mão de alguns idiotas?” em seus versos finais, qualquer semelhança com algum País Sul Americano, talvez não seja mera coincidência

“Não pude evitar sentir vergonha de viver em uma terra
Onde a justiça é um jogo
Agora todos os criminosos de terno e gravata
Estão livres pra beber martinis e ver o sol nascer
Enquanto Rubin senta como um Buda em uma cela minúscula
Um homem inocente no inferno
Essa é a historia do Hurricane
Mas não vai acabar até que limpem seu nome
E devolvam o tempo perdido
Colocado em uma cela, mas um dia poderia ter sido
O campeão do mundo”

Apesar de sua longa duração, o arranjo maravilhoso torna sua audição prazerosa, o violino ditando todo o ritmo, Dylan cantando como nunca, um verdadeiro clássico do cancioneiro americano. O álbum segue com “Isis” onde a indefectível harmônica de Dylan impera, para logo depois dividir o vocal com Emmylou Harris num estranho dueto em “Mozambique”, mas é em “On more cup of coffe” que há uma bela integração entre os dois, emoção, lamento, angustia e um certo desespero é transpassado em suas vozes, como se elas saíssem de suas almas, transformando em uma das mais desesperadamente belas das canções de Dylan. Fechando este lado, outro belo dueto com Emmylou em “Oh, Sister”, mais uma vez a integração dos dois é perfeita, pontuada pela harmônica de Dylan e o violino de Scarlet, transforma em mais uma bela canção deste sensacional disco.

“Joey” abre o outro lado, bela crônica sobre outro personagem real, Joey Gallo, descendente de italianos, gângster, mafioso, “rei das ruas, criança brincalhona”. “Romance in Durango” uma espécie de guarania do folk, onde mais uma vez brilha o dueto Dylan e Emmylou, mas é com “Sara” balada belamente triste, que fecha o disco que Dylan canta com o sofrimento da separação indesejada, rompimento de um amor eterno, em “Sara” não há simbolismos, não há metáforas; há a expressão clara, dolorosa de uma paixão. Dylan lembra imagens do passado comum, os filhos brincando com baldinho na praia, ou uma tarde passada em um bar de Portugal diante de uma garrafa de rum, entremeando essas recordações, o refrão: “Sara, Sara”, com elogios, agradecimentos, e, ao fim, uma súplica: “Sara, Sara, doce anjo virgem, doce amor da minha vida. Sara, Sara, jóia radiante, esposa mística, amar você é a única coisa de que não vou me arrepender nunca. Sara, Sara, bela mulher, tão cara ao meu coração, você precisa perdoar minha indignidade. Sara, Sara, ninfa glamorosa, não me abandone nunca, nunca vá embora”. Talvez, nunca um artista tenha se exposto tanto na sua vida pessoal como ele nesta música, provavelmente esta dor da separação tenha tido influência na grandiosidade das canções deste magnífico LP, Dylan estava com o coração aberto, emoção a flor da pele. Dor de amor para os gênios é uma fonte inesgotável de inspiração.

Um disco completo que só provou a grande genialidade deste músico que mesmo com o passar do tempo tem dado provas de que é um músico excepcional, que mereceu, merece e merecerá toda nossa admiração.

Para um disco tão excepcional, o seu lançamento em CD merecia uma atenção especial, projeto gráfico mal cuidado, sem as informações que havia no LP, um desrespeito ao artista e ao ouvinte, se era para lançar assim, era melhor que o não fizesse terrível.

Ano de lançamento: 1976
Ano de aquisição do LP: 1976
Ano de aquisição do CD: 10/1998

domingo, 28 de março de 2010

LP Revolver - The Beatles


Muito se fala que o grande disco dos Beatles é o "Sargent Pepper's...", que seria o divisor de águas não só do grupo como da história do rock, o disco realmente é sensacional, é tudo o que falaram e falam dele até hoje, mas, na minha modesta opinião, o melhor disco dos Fab Four é este Revolver, sem ele o outro não existiria, da música a capa, aqui foi plantada toda a semente do disco posterior, foi neste disco que se verificou a verdadeira evolução deste quarteto fantástico, o disco é irretocável, os arranjos passaram a ser mais elaborados, com a introdução de instrumentos como a Tabla, o efeito da instrumentação com rotação invertida, tudo está aqui, o álbum reflete os novos interesses do grupo: LSD, música indiana, nostalgia pela música da antiga Inglaterra e uma necessidade de escapar das canções de amor convencionais, só que o disco, apesar do grande sucesso, ficou meio esquecido na história do grupo, ofuscado pelo lançamento posterior, este sim, com um grande apelo de marketing e claro, sua excelente música.

O disco inicia com um dos mais belos rock da carreira do grupo "Taxman" de autoria do competentíssimo e ótimo George Harrison, que infelizmente junto com Ringo Starr, viveram sempre na sombra da dupla famosa, a música era uma crítica do guitarrista aos escorchantes impostos cobrados pelo governo da Rainha Elizabeth II, além de detonar e enterrar de vez a era juvenil do grupo, aqueles rapazes alegres tinham amadurecido. "Eleanor Rigby" um verdadeiro clássico, canção de Paul sobre solidão e alienação o seu vocal inicial com o acompanhamento dos violinos é reconhecido logo nos primeiros acordes, a orquestra de violinos segue emoldurando o belo arranjo, esta tem a cara de Paul McCartney. "I'm only sleeping" uma bem mais John Lennon, com os acordes da orquestra com rotação invertida dá o tom inovador a música, o seu final com um som oriental era o preparo para a introdução de "Love you to" outra do Harrison que inicia com uma Tabla e uma arranjo pra lá de oriental que conduz a canção, que fala de reflexão, de mudanças, a semente do futuro do som do grupo estava lançada. "Here, There and Everywhere" uma balada mais do que perfeita composta por Paul, com arranjos complexos e harmonias distintas entre si. "Yellow Submarine" é o momento descontração do disco, brincadeira que resultou futuramente em um disco e um filme em desenho animado, é cantada por Ringo, acompanhada no vocal pelos outros. Fechando o lado A, "She said she said" outra com a cara do John, diz a lenda que feita em mais uma das "viagens" dele, a letra levanta mais ainda a suspeita de que Paul estaria morto, "Eu sei o que é estar morto" diz.

O lado B, começa com "Good day sunshine" flerte da dupla com o Jazz, o solo de piano é algo. "And your bird can sing" é a mais experimental do disco, vocais sobrepostos e a guitarra de Harrison tocada ao contrário. Mais uma bela balada com a cara de Paul "For no one", arranjo rebuscado e belíssimo, com inserções de metais que abrilhantam a música. "Dr. Robert" resquício da era jovem do grupo, inspirada no som dos anos cinquenta. "I want to tell you" e "Got to get you into my life" são dois exemplos da qualidade sonora do grupo, a primeira mais lenta a segunda mais agitada, toda chupada dos metais da soul music, os branquelos ingleses mostrando que também sabiam fazer música pra dançar, metais arrasadores. Para fechar o disco, a mais psicodélica de todas, "Tomorrow never knows", experimentalismo puro, inspirada no dodecafonismo, vocal dissonante de John, apesar do título, era a antecipação para o que viria posteriormente.

Um disco excepcional de um grupo excepcional, atualíssimo até hoje, o verdadeiro divisor de águas da história moderna da música mundial, sem ele a música não seria a mesma.

Ano de lançamento: 1966
Ano de aquisição: 1976

Curiosidade: Após o lançamento deste disco, surgiu uma das maiores lendas acerca do grupo, a morte de Paul. Tudo começou em 1966. Logo após o lançamento do álbum Revolver, os Beatles pararam de excursionar durante um breve período em razão da complexidade de transposição das músicas do estúdio para o ao vivo. Isso, aliado a um acidente de moto sofrido por Paul, despertou a criatividade do público, que começou a buscar uma explicação para o “sumiço” temporário do baixista da banda. Esse acidente lhe rendeu um dente quebrado e uma cicatriz no lábio, que carrega até hoje. Segundo diz a lenda, ele teria furado um cruzamento e colidido contra um carro no dia 9 de novembro de 1966. Daí veio a história de um concurso de sósias para substituir o músico em suas funções, e, posteriormente, os produtores começaram a soltar pistas sobre a morte do músico. O escolhido? Um sujeito chamado Billy Shears.

O disco foi lançado antes do suposto acontecimento, mas mesmo assim entrou para o hall de pistas sobre a morte de Paul. Trata-se da primeira capa de um disco dos Beatles desenhada; isso teria sido pensado para que o público não reconhecesse o sósia. Também há uma mão aberta em cima de sua cabeça, sinal de benção aos mortos em diversas culturas. Esse símbolo seria repetido em inúmeras oportunidades, reforçando cada vez mais a lenda, como por exemplo na capa de Yellow Submarine, na capa de Abbey Road, outras suspeitas e em muitas outras histórias.
A verdade é que se isto tudo não é lenda, foram buscar um sósia bem parecido e um músico do caralho, tão bom ou melhor que o original, a prova é o que ouvimos até hoje.

sábado, 27 de março de 2010

LP e CD Station to Station - David Bowie


O som do trem no início da bela "Station to station" é o sinal de que o Camaleão está iniciando mais uma mudança no seu rumo musical e ele nos leva nessa nova viagem para beber na fonte dos primórdios do rythm blues, como já demonstrou no ótimo disco anterior "Young Americans", já comentado neste blog, só que desta vez Bowie reprocessa tudo e aponta para o futuro, reciclando e inovando o ritmo, o som da guitarra pode tranparecer que a viagem passa por local incerto e inóspito, para logo depois desaguar num pancadão sonoro, numa profusão de sons dançáveis. A música com dez minutos de duração, tempo suficiente para David Bowie desfilar um palavratório sobre totalitarismo, cocaína, esgotamento pessoal e flertar com o futuro de livros como "1984" (George Orwell) e "Admirável Mundo Novo" (Aldous Huxley).

Foi também em Station que mostrou um personagem controvertido, o "Thin White Duke", que causou revolta ao desembarcar em Londres e fazer a saudação nazista para os fãs. Era uma figura fria, sem emoção, calculista e sedutora, visualmente o personagem era uma extensão de Thomas Jerome Newton, seu personagem no filme de ficção científica "O Homem que caiu na Terra" dirigido por Nicholas Roeg, lançado em 1975, pouco visto aqui no Brasil, uma interessante história de um extraterrestre que vinha a Terra atrás de um líquido primordial para a sobrevivência de seus pares do seu Planeta e que já estava se esgotando por lá, a água, Bowie está muito bem neste papel. A capa deste disco é tirada de uma cena do filme.

Segue-se outra bem dançável e a mais bem sucedida comercialmente do disco, a funkeada "Golden Years", o baixão determinando o ritmo, irresistível numa pista de dança, versatilidade pura. "Word on a Wing" que fecha o lado 1, é uma das mais belas canções feitas por ele, uma balada pop bem apropriada para sua ótima voz, que ressalta versos como "Senhor, eu me ajoelho e ofereço minhas palavras ao vento/E estou tentando duramente me ajustar ao seu projeto", sobressai o piano de Roy Bittan oriundo da banda de Bruce Sprigsteen.

Já "TVC15", que abre o lado 2, fala de uma televisão holográfica que engole uma suposta namorada, mais uma vez a soul music predomina, nesta balada dançante, como não deixam negar o corinho e a levada do baixo e guitarra. "Stay" com sua batida fortemente influenciada da disco music, parecia ser uma forte candidata a fazer sucesso nas pistas de dança, mais uma vez Bowie inova em um ritmo da época, hoje, vê-se que foi pouco compreendido pela galera que "soltava suas asas", a disco music ficou, a sua música continuou. Encerrando o trabalho, uma versão magnífica de "Wild is The Wind", uma arrasadora balada, onde mostra toda sua versatilidade como cantor.

Outro grande disco deste inigualável artista, logo após este ele entraria em sua fase alemã, mas aí é uma outra história, que será comentada mais adiante.





No CD, além das músicas do LP, remasterizadas e evidentemente numa qualidade sonora melhor, principalmente em relação a ótima voz de Bowie, a foto da capa do LP foi colorizada (foto acima) e incluída duas versões ao vivo do "Station to station Tour", gravadas em 23/3/1976 no Nassau Coliseum em Long Island, USA. Na versão ao vivo de "Word on a Wing", nada de novo em relação a versão original, a não ser o destaque para a grande voz de Bowie. A outra versão do disco foi para "Stay", esta um pouco diferente da original, menos disco e mais rock, com a guitarra do excelente Carlos Alomar em destaque, mas o baixão continua lá.

Uma curiosidade: Bowie disse certa vez que se tornou artista ao ver um vídeo e depois uma foto de Little Richard com seus saxofonistas e se saiu com uma dessa, "Eu sabia que não podia ser Little Richard, mas pelo menos eu poderia ser um dos seus saxofonistas, pensei. Assim pedi a meu pai para emprestar dinheiro para comprar um sax. Foi assim que eu comecei."
Ainda bem que Little usava saxofone no seu grupo.


Ano de lançamento: 1976
Ano de aquisição do LP: 04/1976
Ano de aquisição do CD: 03/1992

segunda-feira, 22 de março de 2010

LP e CD Bob Dylan's Greatest Hits - Bob Dylan



Com o lançamento de uma coletânea, fica-se a expectativa de que o melhor do artista seja disponibilizado, por isso que praticamente no mundo inteiro a denominação “greatest” é usada a exaustão, como se esta palavra determinasse a qualidade de cada artista, mas pode não ser bem assim, aliás, na maioria das vezes o tal “greatest” se resume no máximo a duas boas músicas, tornando-se a audição do restante do disco um martírio. Só que há artistas como Bob Dylan, que provam que a tal palavra “greatest” pode sim, representar o que de melhor um artista pode produzir, claro que ele não está só neste rol, mas é aí que verificamos que há realmente artistas diferenciados e Bob Dylan é um deles, este “Greatest Hits Vol. I” é a demonstração mais palpável disto. Dificilmente uma coletânea teve tantos clássicos como esta, e o que impressiona é a unidade existente no disco, uma amostra de que a produção inicial deste bardo revolucionário é mesmo de uma qualidade sem igual na história musical universal. O prazer que a audição de um disco como este lhe provoca é indescritível, mesmo que as letras tenham perdido um pouco de sua força, como no caso da extraordinária e sempre atual “Blowin´in the Wind” afinal o ímpeto juvenil revolucionário de quem escuta, foi substituído pela preocupação diária da vida.

Fica-se a dúvida se é fácil ou difícil escolher o repertório para uma coletânea de um artista como Bob Dylan, tal a profusão de músicas de qualidade produzida por ele, o certo é que esta coletânea expressa o que de melhor ele produziu, tornando-a fantástica, afinal o que dizer de um disco que contém músicas como a já citada “Blowin´ in the Wind”, “Lay Lady Lay”, “Like a Rolling Stone”, “Mr. Tambourine Man”, “Subterranean Homesick Blues” e “Just Like a Woman”, a não ser que é genial.

No lançamento do CD nenhuma novidade, a não ser a melhoria na qualidade tecnológica, projeto gráfico terrível, merecia um melhor cuidado.

Ano de lançamento: 1975
Ano de aquisição do LP: 1976
Ano de aquisição do CD: 11/96

domingo, 21 de março de 2010

LP Help! - The Beatles


Se algum Extraterrestre (afinal, qualquer terráqueo conheceria o grupo) aportasse na Terra e desavisadamente pegasse um disco com este título, poderia logo imaginar que se tratava de algum grupo com linha melódica depressiva, com arranjos sombrios, soturnos e pesados, com letras que buscassem uma saída desesperada para a solução de seus problemas psiquícos existenciais e conseguissem dar um sentido a sua vida. Se este Alienígena fosse bem resolvido, ao escutar o disco, logo perceberia, se tratar de um conjunto das mais belas composições de alto astral e anti depressivas, eles poderiam estar gritando por ajuda por tudo, menos para curar depressão.

Trilha sonora do deliciosamente bobinho filme homônimo, onde o que menos importava era o roteiro, este servia apenas como gancho para o desfile das ótimas canções do disco, cada aparição deles cantando era motivo para delírio ensandecido das fãs. É neste disco e na música título que eles utilizam pela primeira vez instrumentos indianos como a sítara que mais adiante resultaria no polêmico ingresso na seita indiana. No resto são clássicos, clássicos e mais clássicos do começo ao fim, falar de qualquer disco dos Beatles, é como se diz "chover no molhado" são só elogios, muito já se falou deles, é impressionante como eles conseguiram uma conjunção perfeita no pop, músicas de uma qualidade que grudam na sua mente. Todo o lado A, são de canções do filme, difícil não citar uma delas como clássico eterno dos Beatles, "Help", "You've got to hide your love away", "You're going to lose that girl" e "Ticket to ride" são as melhores, encantam até hoje.

O lado B, com canções que não fizeram parte do filme, tem em "Yesterday" o carro chefe do disco, a música mais gravada por outros artistas da história, mais de 3000 gravações catalogadas, é realmente um primor musical, mesmo com tantas gravações, mesmo com repetições ad infinitum, que poderiam fazer dela uma daquelas músicas que ninguèm conseguiria mais ouvir, ao contrário, cada nova audição, difícil não cantar, não assobiar, não se emocionar, pérola musical que não envelhece, não se esgota. Com músicas menos conhecidas, percebe-se a qualidade sonora dos Fab Four, com seu estilo próprio e sua marca registrada, eles desfilam o mais puro pop, passeando pelo country "Act Naturally" até o rock "Dizzy Miss Lizzy" que é outro destaque, com seu andamento mais acelerado e pesado, nitidamente mais com a "cara" de John Lennon, o mais rocker dos quatro, a guitarra elétrica conduz tudo, muita gente nos tempos de hoje gostaria de fazer um rock assim.

Impossível não gostar dos Beatles, quem diz que não gosta, ou não gosta de música ou está apenas tirando onda, um dia vai gostar.

Ano de lançamento: 1965
Ano de aquisição: 1976

domingo, 7 de março de 2010

LP Revolver - Walter Franco


Com um trabalho diferenciado e fora dos padrões da mesmice que imperava na época e sempre focado na inovação, Walter Franco foi estigmatizado como “maldito”, estigma este que infelizmente o acompanha até os dias de hoje, o que dificultou a continuidade do seu trabalho artístico tendo como consequência lançamentos esporádicos, nos privando da excelente música produzida por este poeta concretista do trocadilho. A vaia recebida na final do Festival Internacional da Canção da Rede Globo em 1972, quando defendeu a desconcertante música “Cabeça” também deve ter contribuído para colocá-lo à margem do sucesso, mesmo assim Walter nunca abriu mão da inovação e desenvolvimento de seu estilo de compor e cantar. Juntamente com artistas como Jards Macalé, Tom Zé (pré David Byrne) e mais adiante Itamar Assumpção e Arrigo Barnabé que sempre calcaram os seus trabalhos em composições mais elaboradas, buscando a inovação nos seus arranjos, o certo é que todos eles sempre tiveram dificuldades em gravar, uns mais outros menos, viveram meio que à margem da produção fonográfica brasileira, pior para os amantes da boa música, quando lançavam um disco, era motivo de comemoração para aqueles que necessitavam de um sopro de inovação musical.

O lançamento de “Revolver” do Walter Franco pode ser incluído no rol dos discos fundamentais para a evolução da música popular brasileira, neste disco, Walter tenta consolidar o seu lado mais “pop”, se é possível rotulá-lo assim, sem abrir mão de sua qualidade sonora, a verdade é que ele mescla seus acordes minimalistas com um rock anos setenta em “Feito gente” para logo após em “Eternamente” mostrar sua assinatura musical, a colagem de vocais e sussurros superpostos, em “Mamãe d’água” uma versão nebulosa utilizando a mesma métrica lingüística de “Bat Macumba” do Gilberto Gil, elegantemente sombria. A visão dele para o samba é mostrada e percebida já desde o trocadilho do título em “Partir do Alto”, só que a linha evolutiva do samba é modificada e pontuada por teclados numa linha de acordes repetitivos, samba que muita gente gostaria de ter feito, as duas últimas músicas do lado A, são as que mais representam o som feito por Walter Franco, “1 Pensamento” quase uma vinheta, com ele solo no violão e “Toque Frágil” onde impera a colagem de vozes, sons superpostos em rotações diferenciadas e gente falando, lembrando a “Cabeça”, num festival com certeza tomaria outra vaia, no disco é um primor de música.

O Lado B começa com a balançada e vamos dizer assim meio “pop” (afinal, maldito nunca faz nada popular) “Nothing” que se fosse escrita por uns tais Lennon e McCartney, teria feito sucesso no mundo inteiro, sem exageros, mas, como foi feita por um “maldito” ficou na obscuridade. O impressionante é que ele sempre consegue dar tonalidade própria em suas canções, com arranjos inovadores e diferenciados entre si, mas tendo como linha principal a sua maneira econômica de cantar, como se solvesse cada palavra cantada, “Arte e Mania” e “Bumbo do mundo” são exemplos neste disco. “Cena maravilhosa” parceria com seu pai Cid Franco, também é cantada destacando a emoção em cada sílaba, fechando o disco a enigmática “Revolver”, mais uma vez o poema econômico, beirando o minimalismo prevalece, o que faz destacar o belo arranjo, mais uma vez diferenciado, mais uma vez inovador, Walter canta com uma força poucas vezes vista, uma interpretação para mostrar ao mundo que quem estava ali não era nenhum maldito.

O lançamento deste disco na época, com sua arte gráfica bem cuidada, inclusive com o título escrito em braile (mostrando estar à frente do seu tempo não só na música) foi uma tentativa da gravadora para enterrar de vez o estigma de “maldito” de Walter Franco, mas diante da mesmice e falta de criatividade que imperava na MPB, ele não foi muito bem aceito pelo público o que ajudou mais ainda a consolidar este terrível estigma, Walter se recolheu artisticamente, lançando discos esporádicos, pior para nós.

Ano de lançamento: 1975
Ano de aquisição: 1976

Nota: Sempre nutri uma admiração pela música de Walter Franco, me lembro vagamente da vaia que ele levou no festival de 1972 com a música “Cabeça”, mas mesmo garoto de doze anos, ela nunca me saiu (desculpem o trocadilho) da cabeça, com o passar dos anos via que aquele músico que não saia da minha cabeça, era o caminho da inovação na MPB, pena que os seus discos se tornaram cada vez mais esparsos, era muito decepcionante a cada ano saber que o que poderia ser o sopro criativo da música, não lançaria nada de novo, realmente foi uma pena.

LP The Rolling Stones Nº 2 - The Rolling Stones


Mais um da fase inicial do grupo, quando ainda contava com o "maluco beleza" do Brian Jones, é visível a jovialidade e vigor das músicas desta fase, o Brian teve uma importância fundamental para plantar a raíz do som feito pelo grupo, R&B crioulo no sangue dos branquelos, "Everybody needs somebody to love" que abre o disco é um exemplo, o batidão de guitarra e baixo é irresistível, poucos conseguiram tocar tão bem o ritmo crioulo quanto os Rolling Stones, Mick Jagger como fundo vocal para salientar a parte instrumental deu o molho necessário a este blues.

O disco segue destilando muito rock calcado no blues e R&B, a harmônica de Mick em "Down Home Girl" junto a guitarra de Brian é pura emoção. "You can't catch me" tem a assinatura de um dos grandes ídolos do grupo, Chuck Berry, particularmente para Keith Richard fonte inspiradora para seus grandes riffs, o negão realmente era demais, puro balanço, em seguida um dos clássicos do grupo "Time is on my side" que inicia arrebentando com um solo de Keith, a bateria de Charlie segura tudo e determina o ritmo. O lado A finaliza com duas composições da dupla Jagger-Richard, onde fica notório a influência do rythmy and blue americano no som do grupo, ainda longe dos grandes clássicos da dupla, era evidente a qualidade musical de ambos em compor.

O lado B, inicia com mais um rock básico a la anos 50, "Down the road apiece" balanço puro, guitarra e piano acelerados num duelo elétrico, já "Under the boardwalk" é totalmente inspirada nas canções dos grupos vocais americanos do final dos anos 50, o vocal no refrão diz tudo, apesar da inspiração, o molho dado por Charlie e Brian fazem a diferença. "I Can't be satisfied" é de mais um ídolo do grupo Muddy Waters, grande músico de blues americano, reverenciado pelos grandes grupos de rock, de uma de suas músicas foi retirado o nome que batizou o grupo. Mais uma que virou clássico "Pain in my heart" curta e bela como deve ser, recheada de ótimos solos de guitarra. Mais uma inspirada e vinda direto dos anos 50, "Off the Hook" que é também da dupla Jagger-Richard, poderia ter sido composta por qualquer um dos grupos vocais americanos, batida irresistível, Charlie comandando tudo, para finalizar, "Suzie-Q" um rock vigoroso e acelerado, mostrando a pujança dos Rolling Stones.

Rock'n'roll básico como demonstração da qualidade e potencial do som elaborado pelo grupo, que seria confirmado em futuros lançamentos e transformaria eles na maior banda de rock'n'roll do mundo.

Ano de Lançamento:1965
Ano de aquisição: 1976

segunda-feira, 1 de março de 2010

LP Nashville Skyline - Bob Dylan



Segundo disco lançado após o grave acidente de motocicleta, até hoje nunca explicado, que virou um mistério de sua biografia, que quase vitimou o astro, deixando-o de molho por uns dois anos. Muitos acreditaram, na época, que sua carreira estivesse acabada, tendo em vista o mistério que envolvia o acidente, Bob Dylan virou um recluso nestes dois anos de inatividade artística. Após o molho, um novo Dylan surgiu, mostrando que o acidente não tinha deixado sequelas, ele estava compondo como nunca, os fãs mais ardorosos estranharam quando ele lançou o excelente "John Wesley Harding" numa versão acústica e mais contido, ele envereda para a Country Music, mostrando que sua genialidade estava afeita a qualquer tipo de música, principalmente quando aquela era a sua praia.

Com o espírito de seu público já preparado, Dylan lança este LP que virou um marco na história da música americana e da Country Music em particular, de onde saiu um dos grandes sucessos do compositor, a hoje clássica "Lay Lady Lay". Neste disco, Dylan mudou de rumos artísticos, afastando-se do movimento folk de protesto e voltando-se para canções mais pessoais, instrospectivas, ligadas a uma visão muito particular de mundo. As questões sócio-políticas de seu tempo: racismo, guerra fria, guerra do Vietnã, injustiça social, cedem espaço para a temática das desilusões amorosas, amores perdidos, vagabundos errantes, liberdade pessoal, viagens oníricas e surrealistas, embaladas pela influencia da poesia.

Se Dylan havia surpreendido por lançar um disco mais "conservador" em uma época em que todas as bandas apostavam alto na psicodelia e em drogas, aumentaria ainda mais o espanto ao lançar este "Nashville Skyline", Dylan estava realmente cantando, com uma voz mais empostada, em alguns momentos até de maneira irreconhecível, quem ouviu pela primeira vez "Lay Lady Lay", grande sucesso do álbum custou a crer que era Bob Dylan. O álbum abre com uma das mais belas parcerias da história: Dylan e a lenda viva da música americana Johnny Cash cantam uma canção que Bob havia gravado em seu segundo álbum, "The Freewheelin' Bob Dylan", "Girl from the North Country", quando dois gênios se encontram, só pode resultar em uma pepita sonora, poderia ser o grande sucesso do disco se não fosse ofuscada por "Lay Lady Lay".

"Nashville Skyline Rag" um country western instrumental, com banjo, guitarra havaiana e a indefectível harmônica de Dylan brilhando na música. Com sua voz anasalada, mais empostada e mais grave, ele vai desfilando canções que nos fazem esquecer que a Country music não pode estar atrelada ao chatérrimo do Willie Nelson e que há sim coisas boas e que pode ser um estilo musical agradável de se ouvir, canções curtas que mostram a genialidade do artista. O lado B começa com a excepcional "Lay Lady Lay", a música havia sido composta para a trilha do filme "Midnight Cowboy", grande sucesso na época e um dos clássicos do cinema mundial, mas perdeu o prazo de inclusão por atraso nas gravações. Os produtores acabaram usando "Everybody’s Talking", de Fred Neil. Pior pra eles, o disco segue com alguns rocks com uma levada country que podem ser considerados como os precursores do country rock, os destaques são "Tell Me That It Isn’t True" e "Tonight I’ll Be Staying Here With You" que fecha o disco, o início da letra já diz tudo, “Jogue minha passagem pela janela / Jogue minha maleta por lá também / Jogue meus problemas pela porta / Eu não preciso mais deles / Porque essa noite vou ficar com você!" Dylan afugentando suas neuroses, numa balada bem leve com um certo ar alegre.

Com este disco e suas belas canções, ficou a certeza que o talento extraordinário de Bob Dylan não foi afetado pelo misterioso acidente, provado por tantos e tantos outros discos excepcionais lançados até hoje.

Ano de lançamento: 1969
Ano de aquisição: 1976

Nota: Este foi mais um disco importado que comprei na "Modern Sound", junto com a leva anterior comentada aqui no blog, lembro-me que queria um disco do Dylan que não estava mais em catálogo aqui no Brasil, na dúvida de muitos optei por este que pouco conhecia, talvez mais pela capa e pela música "Lay Lady Lay", o disco estava lacrado e só o escutei quando cheguei ao Recife, confesso que estranhei a sonoridade do Bardo revolucionário, deixei-o encostado por muitos anos, para redescobri-lo depois com muito prazer, só gênios proporcionam isso.