domingo, 7 de março de 2010

LP Revolver - Walter Franco


Com um trabalho diferenciado e fora dos padrões da mesmice que imperava na época e sempre focado na inovação, Walter Franco foi estigmatizado como “maldito”, estigma este que infelizmente o acompanha até os dias de hoje, o que dificultou a continuidade do seu trabalho artístico tendo como consequência lançamentos esporádicos, nos privando da excelente música produzida por este poeta concretista do trocadilho. A vaia recebida na final do Festival Internacional da Canção da Rede Globo em 1972, quando defendeu a desconcertante música “Cabeça” também deve ter contribuído para colocá-lo à margem do sucesso, mesmo assim Walter nunca abriu mão da inovação e desenvolvimento de seu estilo de compor e cantar. Juntamente com artistas como Jards Macalé, Tom Zé (pré David Byrne) e mais adiante Itamar Assumpção e Arrigo Barnabé que sempre calcaram os seus trabalhos em composições mais elaboradas, buscando a inovação nos seus arranjos, o certo é que todos eles sempre tiveram dificuldades em gravar, uns mais outros menos, viveram meio que à margem da produção fonográfica brasileira, pior para os amantes da boa música, quando lançavam um disco, era motivo de comemoração para aqueles que necessitavam de um sopro de inovação musical.

O lançamento de “Revolver” do Walter Franco pode ser incluído no rol dos discos fundamentais para a evolução da música popular brasileira, neste disco, Walter tenta consolidar o seu lado mais “pop”, se é possível rotulá-lo assim, sem abrir mão de sua qualidade sonora, a verdade é que ele mescla seus acordes minimalistas com um rock anos setenta em “Feito gente” para logo após em “Eternamente” mostrar sua assinatura musical, a colagem de vocais e sussurros superpostos, em “Mamãe d’água” uma versão nebulosa utilizando a mesma métrica lingüística de “Bat Macumba” do Gilberto Gil, elegantemente sombria. A visão dele para o samba é mostrada e percebida já desde o trocadilho do título em “Partir do Alto”, só que a linha evolutiva do samba é modificada e pontuada por teclados numa linha de acordes repetitivos, samba que muita gente gostaria de ter feito, as duas últimas músicas do lado A, são as que mais representam o som feito por Walter Franco, “1 Pensamento” quase uma vinheta, com ele solo no violão e “Toque Frágil” onde impera a colagem de vozes, sons superpostos em rotações diferenciadas e gente falando, lembrando a “Cabeça”, num festival com certeza tomaria outra vaia, no disco é um primor de música.

O Lado B começa com a balançada e vamos dizer assim meio “pop” (afinal, maldito nunca faz nada popular) “Nothing” que se fosse escrita por uns tais Lennon e McCartney, teria feito sucesso no mundo inteiro, sem exageros, mas, como foi feita por um “maldito” ficou na obscuridade. O impressionante é que ele sempre consegue dar tonalidade própria em suas canções, com arranjos inovadores e diferenciados entre si, mas tendo como linha principal a sua maneira econômica de cantar, como se solvesse cada palavra cantada, “Arte e Mania” e “Bumbo do mundo” são exemplos neste disco. “Cena maravilhosa” parceria com seu pai Cid Franco, também é cantada destacando a emoção em cada sílaba, fechando o disco a enigmática “Revolver”, mais uma vez o poema econômico, beirando o minimalismo prevalece, o que faz destacar o belo arranjo, mais uma vez diferenciado, mais uma vez inovador, Walter canta com uma força poucas vezes vista, uma interpretação para mostrar ao mundo que quem estava ali não era nenhum maldito.

O lançamento deste disco na época, com sua arte gráfica bem cuidada, inclusive com o título escrito em braile (mostrando estar à frente do seu tempo não só na música) foi uma tentativa da gravadora para enterrar de vez o estigma de “maldito” de Walter Franco, mas diante da mesmice e falta de criatividade que imperava na MPB, ele não foi muito bem aceito pelo público o que ajudou mais ainda a consolidar este terrível estigma, Walter se recolheu artisticamente, lançando discos esporádicos, pior para nós.

Ano de lançamento: 1975
Ano de aquisição: 1976

Nota: Sempre nutri uma admiração pela música de Walter Franco, me lembro vagamente da vaia que ele levou no festival de 1972 com a música “Cabeça”, mas mesmo garoto de doze anos, ela nunca me saiu (desculpem o trocadilho) da cabeça, com o passar dos anos via que aquele músico que não saia da minha cabeça, era o caminho da inovação na MPB, pena que os seus discos se tornaram cada vez mais esparsos, era muito decepcionante a cada ano saber que o que poderia ser o sopro criativo da música, não lançaria nada de novo, realmente foi uma pena.

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